Descubra como a startup Builder.ai, avaliada em US$ 1,5 bilhão, teria usado centenas de engenheiros para simular automação por inteligência artificial e se envolveu em esquemas de “round-tripping”, levantando sérias questões sobre transparência e fraude contábil em startups de tecnologia.
Em um mundo cada vez mais fascinado pela promessa da inteligência artificial, a linha entre a inovação revolucionária e a simples automação manual disfarçada pode, por vezes, se tornar tênue. O que acontece quando a tecnologia de ponta anunciada é, na realidade, o fruto do trabalho árduo e não visível de centenas de pessoas? E qual o impacto no mercado financeiro e na confiança dos investidores quando as demonstrações financeiras de startups promissoras se revelam infladas por práticas contábeis questionáveis? A história recente da startup britânica Builder.ai lança uma luz inquietante sobre essas questões, forçando-nos a refletir sobre a necessidade premente de transparência e regulamentação no vertiginoso universo da tecnologia.
A Fachada da Automação e o Esquema de Round-Tripping
Fundada em 2015 com a ambição de democratizar a criação de softwares, a Builder.ai prometia uma plataforma “no-code” revolucionária, capaz de montar aplicativos com a facilidade de blocos de Lego, tudo orquestrado por uma assistente virtual baseada em inteligência artificial chamada Natasha. A narrativa era poderosa: em um piscar de olhos, qualquer um poderia ter seu software sob medida, sem precisar escrever uma linha de código, graças à magia da IA. No entanto, por trás dessa fachada futurística, segundo documentos obtidos pela Bloomberg e investigações subsequentes, a realidade operacional era drasticamente diferente.
Em vez de algoritmos autônomos e sistemas inteligentes, a Builder.ai supostamente dependia de uma equipe de cerca de 700 engenheiros baseados na Índia. O trabalho desses profissionais era, na prática, desenvolver manualmente os softwares conforme os pedidos dos clientes, mascarando essa operação como se fosse o resultado do processo automatizado da plataforma. Essa mão de obra invisível, embora altamente qualificada, descaracterizava a principal proposta de valor da empresa, que era justamente a automação e a eliminação da necessidade de codificação manual. A promessa da inteligência artificial estava sendo usada, neste caso, como um rótulo para uma operação de desenvolvimento de software tradicional, apenas terceirizada e escondida sob uma narrativa tecnológica mais atraente para o mercado financeiro e para os clientes em busca de soluções rápidas e “inteligentes”.
Além da suposta falsa automação, a Builder.ai teria se envolvido em práticas contábeis que levantaram sérias bandeiras vermelhas. De acordo com as mesmas fontes, a startup britânica teria participado de um esquema conhecido como “round-tripping” com a empresa indiana VerSe Innovation, dona de plataformas populares como o aplicativo de notícias Dailyhunt e a plataforma de vídeos curtos Josh. Essa prática envolve a troca de faturas de valores similares entre duas empresas, criando a aparência de receita e despesa legítimas, mas sem uma transação real de bens ou serviços que justifique o valor total das faturas.
Entre 2021 e 2024, a Builder.ai e a VerSe Innovation teriam trocado faturas que, na prática, representavam valores equivalentes. Essa manobra contábil teria o objetivo primário de inflar artificialmente as receitas da Builder.ai em seus livros, apresentando um quadro financeiro muito mais robusto do que a realidade, com estimativas de superestimação de vendas chegando a 300%. Essa inflação permitiu que a startup atraísse investimentos significativos e elevasse sua avaliação de mercado para impressionantes US$ 1,5 bilhão, posicionando-a como um “unicórnio” no ecossistema global de startups de tecnologia.
Reações, Consequências e Investigações
Diante das graves acusações de fraude contábil em startups de tecnologia e falsa representação de suas capacidades, a VerSe Innovation se manifestou publicamente para refutar as alegações. Umang Bedi, cofundador da companhia indiana, declarou à Bloomberg que as acusações eram “absolutamente falsas e infundadas”. A VerSe afirmou que os serviços trocados com a Builder.ai foram legítimos e devidamente verificados por auditores externos, classificando as acusações como “difamatórias e irresponsáveis”. A postura da VerSe é de negação veemente, buscando dissociar-se das práticas questionáveis atribuídas à Builder.ai.
Para a Builder.ai, as consequências das supostas irregularidades não tardaram a aparecer e foram severas. Em 2023, a credora Viola Credit congelou US$ 37 milhões da empresa após o descumprimento de obrigações de dívida. Esse evento marcou o início de um período turbulento para a startup, culminando na abertura de um processo formal de insolvência no Reino Unido. Um administrador judicial foi nomeado para supervisionar o processo e tentar recuperar ativos em benefício dos credores.
Paralelamente aos desafios financeiros e ao processo de insolvência no Reino Unido, as autoridades americanas também voltaram seus olhos para a Builder.ai. Investigações foram abertas, e intimações foram emitidas solicitando a entrega de documentos financeiros detalhados, políticas contábeis e listas de clientes. A pressão regulatória e judicial se intensificou, buscando esclarecer a extensão das supostas fraudes e irregularidades. A própria Builder.ai, embora não tenha detalhado a magnitude das inconsistências, reconheceu em comunicados públicos a existência de “inconsistências nas vendas históricas”, um eufemismo que, no contexto das alegações, soa como uma admissão parcial de que algo estava fundamentalmente errado em suas demonstrações financeiras.
O Caso Builder.ai Não É Isolado: Um Alerta para o Setor de Tecnologia
É importante notar que o caso da Builder.ai não é um incidente isolado quando se trata de empresas de tecnologia que prometem soluções de ponta baseadas em automação ou inteligência artificial, mas que, na prática, dependem de extenso trabalho manual. Um exemplo notório e amplamente divulgado em 2024 foi o anúncio da Amazon sobre o fim gradual de seu sistema “Just Walk Out”. Esse sistema, utilizado em algumas lojas de conveniência da Amazon Go, prometia uma experiência de compra sem caixas, onde sensores e câmeras identificavam automaticamente os itens retirados pelos clientes, cobrando-os digitalmente ao saírem. A ideia era eliminar as filas e a interação manual no caixa, utilizando visão computacional e outras tecnologias para uma experiência fluida e futurística.
Contudo, a realidade por trás do “Just Walk Out” era menos automatizada do que o marketing sugeria. A Amazon admitiu publicamente que o sistema dependia de mais de 1.000 funcionários localizados na Índia. O trabalho desses funcionários consistia em revisar vídeos das compras para corrigir erros no processo de identificação e cobrança automática, especialmente em situações complexas ou quando a tecnologia falhava. Essa dependência de trabalho humano em larga escala para corrigir as falhas da “automação” tornou o sistema caro e ineficiente em comparação com alternativas mais simples. Diante dos custos operacionais elevados e das limitações da tecnologia, a Amazon decidiu substituir gradualmente o “Just Walk Out” por carrinhos de compra equipados com scanners e caixas de autoatendimento, um retorno a métodos mais convencionais, mas aparentemente mais confiáveis e econômicos. Este caso da Amazon reforça a preocupação de que nem sempre a promessa de inteligência artificial ou automação total reflete a operação subjacente.
Impacto e Implicações para o Mercado e a Confiança
Os casos da Builder.ai e, em certa medida, o do “Just Walk Out” da Amazon, levantam questionamentos cruciais e têm implicações significativas para o ecossistema de startups, o mercado financeiro e a percepção pública sobre a inteligência artificial e outras tecnologias emergentes.
Primeiramente, a transparência. Empresas que prometem inovações disruptivas baseadas em IA ou automação têm a responsabilidade de ser claras sobre como suas soluções realmente funcionam. Quando a promessa de uma inteligência artificial autônoma e escalável se revela uma operação massiva de trabalho manual disfarçado, a confiança do consumidor e do mercado é abalada. A Builder.ai teria não apenas enganado seus clientes sobre a natureza de sua plataforma, mas, mais gravemente, seus investidores e credores sobre sua saúde financeira e o verdadeiro motor de suas supostas receitas. A fraude contábil em startups de tecnologia, se confirmada, não afeta apenas a empresa envolvida, mas lança uma sombra sobre o setor como um todo.
Em segundo lugar, a confiança dos investidores. O apetite do mercado financeiro por startups de tecnologia, especialmente aquelas no espaço de inteligência artificial, tem sido imenso. Avaliações bilionárias são alcançadas rapidamente com base em projeções ambiciosas e narrativas de disrupção. No entanto, casos como o da Builder.ai servem como um alerta severo. Investidores de venture capital, fundos de hedge e outros players do mercado precisam redobrar a diligência (due diligence) ao avaliar essas empresas. É crucial ir além do marketing polido e das apresentações impressionantes para entender a fundo a tecnologia subjacente, a operação real e, crucialmente, a veracidade dos números financeiros. A pressão para crescer rapidamente e atingir status de “unicórnio” pode incentivar práticas contábeis agressivas ou enganosas, tornando auditorias rigorosas e independentes mais essenciais do que nunca. A fraude contábil em startups de tecnologia representa um risco sistêmico que pode minar a alocação eficiente de capital e prejudicar o crescimento genuíno do setor.
Finalmente, a regulamentação. À medida que a inteligência artificial se torna mais onipresente, a necessidade de regulamentações claras e mecanismos de fiscalização aumenta. Isso inclui não apenas a forma como a IA é desenvolvida e utilizada (questões éticas, viés, segurança), mas também a forma como as empresas que a desenvolvem e comercializam se apresentam ao mercado e aos investidores. O caso Builder.ai, se as alegações forem provadas, demonstra uma falha no sistema atual que permitiu que uma empresa com sérias irregularidades operacionais e financeiras atingisse uma avaliação de US$ 1,5 bilhão. Reguladores precisam estar atentos a esquemas de inflação de receita e à falta de transparência na descrição de produtos e serviços tecnológicos. A proteção dos investidores e a manutenção da integridade do mercado financeiro dependem, em parte, da capacidade de identificar e coibir tais práticas.
Conclusão
A saga da Builder.ai serve como um estudo de caso complexo e preocupante no ecossistema de startups e no universo da inteligência artificial. As alegações de falsa automação e fraude contábil em startups de tecnologia, como o “round-tripping”, pintam um quadro sombrio sobre os desafios de transparência e ética que podem surgir sob a intensa pressão por crescimento e validação do mercado financeiro. Enquanto a tecnologia, e em particular a inteligência artificial, continua a oferecer um potencial transformador inegável, é imperativo que tanto as empresas quanto os investidores e reguladores mantenham um olhar crítico e exijam a verdade por trás do marketing. A construção de um futuro tecnológico sustentável depende de fundações sólidas de honestidade, auditoria rigorosa e um compromisso inabalável com a realidade operacional e financeira, e não apenas com narrativas de inovação infladas. O que você acha sobre esse tema? Comente abaixo!
Pontos Principais
- A startup Builder.ai enfrentou alegações de usar 700 engenheiros indianos para simular automação baseada em inteligência artificial, vendendo trabalho manual como produto “no-code”.
- A empresa teria se envolvido em um esquema de “round-tripping” com a VerSe Innovation para inflar artificialmente suas receitas, chegando a superestimar vendas em até 300%.
- Essas práticas teriam permitido à Builder.ai atrair investimentos e alcançar uma avaliação de mercado de US$ 1,5 bilhão.
- A VerSe Innovation negou veementemente as acusações de envolvimento em fraude contábil em startups de tecnologia.
- A Builder.ai entrou em processo de insolvência no Reino Unido e é alvo de investigação pelas autoridades americanas.
- O caso levanta questões sobre a transparência das soluções de tecnologia, o impacto no mercado financeiro e a necessidade de maior diligência e regulamentação no setor de startups.
- O caso da Amazon com o sistema “Just Walk Out”, que dependia de extenso trabalho manual disfarçado de automação, é citado como um paralelo preocupante.
A referência original que inspirou este artigo pode ser encontrada em https://startupi.com.br/builder-ai-inflou-receitas/, e foi produzida com o apoio de inteligência artificial.
Notícia escrita com ajuda de uma IA.