Novas pesquisas apontam que as ambiciosas metas de neutralidade de carbono das gigantes da tecnologia, como Apple, Google e Microsoft, podem estar distantes da realidade devido ao crescente consumo de energia de data centers e o avanço da inteligência artificial.
Todos nós, de alguma forma, testemunhamos ou participamos do avanço vertiginoso da inteligência artificial nos últimos anos. Vemos a cada dia novas ferramentas, novas aplicações e a promessa de um futuro cada vez mais automatizado e eficiente. No entanto, por trás da conveniência e das inovações, existe um custo energético que muitos ainda não compreendem completamente. Pense por um momento na quantidade de processos que ocorrem para que um chatbot responda à sua pergunta ou para que uma ferramenta gere uma imagem a partir de um simples texto. Cada uma dessas interações, cada treinamento de modelo, exige uma quantidade colossal de poder computacional e, consequentemente, de energia. É nesse contexto que um novo relatório surge para lançar uma luz crítica sobre as promessas climáticas das maiores empresas de tecnologia do mundo, sugerindo que suas metas de zerar emissões podem estar descoladas da dura realidade imposta pela própria tecnologia que tanto impulsionam.
O Desafio da Inteligência Artificial e o Consumo de Energia
A inteligência artificial, em suas diversas formas, desde assistentes virtuais até algoritmos complexos de aprendizado de máquina, tornou-se parte integrante de nossas vidas e operações comerciais. Mas o que sustenta essa tecnologia sedenta por dados e processamento? Principalmente, vastos data centers repletos de servidores potentes. O funcionamento desses centros de processamento não é trivial em termos de consumo energético. Cada solicitação que chega a um chatbot, por exemplo, pode consumir uma quantidade surpreendente de recursos. Estudos indicam que para cada 10 a 50 solicitações a um chatbot, meio litro de água limpa é utilizado apenas para resfriamento dos equipamentos. Além disso, o gasto de energia elétrica ocorre em duas fases cruciais: o treinamento inicial desses modelos de linguagem e o seu uso contínuo e efetivo na geração de texto, imagens, códigos e, mais recentemente, vídeos.
Considerando a escala das operações das grandes empresas de tecnologia, que lidam com milhões, talvez bilhões, de solicitações diariamente, o consumo total se torna estratosférico. Plataformas especializadas em medir a pegada de carbono empresarial, como a Greenly, ilustram a magnitude do problema. Um exemplo citado no estudo aponta que uma única empresa, apenas respondendo e-mails, pode emitir cerca de 638 toneladas de CO₂ em um único mês. Ao aplicar esse cálculo a um modelo de linguagem como o GPT-4, a resposta a 1 milhão de e-mails por mês resultaria em emissões de 42.900 kgCO₂e apenas na fase de uso. No entanto, ao considerar as fases de treinamento e uso combinadas, amortizadas em um único mês, o impacto total salta para impressionantes 637.771 kgCO₂e. Para colocar isso em perspectiva, esse volume de emissões equivale a aproximadamente 360 viagens de ida e volta entre Paris e Nova York em apenas um mês, somando mais de 4.300 viagens ao longo de um ano. Esses números são alarmantes e evidenciam o enorme desafio que as gigantes da tecnologia enfrentam para conciliar seu crescimento impulsionado pela inteligência artificial com seus compromissos ambientais.
O Papel dos Data Centers na Conta de Carbono
Os data centers são, sem dúvida, o coração da infraestrutura que sustenta a inteligência artificial e grande parte da tecnologia digital que utilizamos. São instalações massivas, repletas de servidores, sistemas de armazenamento e equipamentos de rede, que funcionam 24 horas por dia, 7 dias por semana. O funcionamento contínuo e a necessidade de manter a temperatura ideal dentro dessas instalações para evitar o superaquecimento dos equipamentos resultam em um consumo de energia elétrica extremamente elevado. A demanda por energia nesses centros tem crescido exponencialmente à medida que a quantidade de dados processados e a complexidade dos algoritmos de inteligência artificial aumentam. Cada nova interação com um sistema de IA, cada consulta em um motor de busca, cada vídeo assistido online, tudo isso contribui para a carga de trabalho dos data centers e, consequentemente, para o seu consumo energético.
Historicamente, a principal fonte de emissão de gases de efeito estufa no setor de tecnologia está diretamente ligada ao consumo de eletricidade por essas instalações. Com o boom da inteligência artificial, essa demanda energética disparou de forma sem precedentes. O treinamento de modelos de linguagem grandes, por exemplo, pode levar semanas ou até meses, exigindo um poder computacional maciço durante todo esse período. Mesmo após o treinamento, o uso contínuo desses modelos para responder a milhões de usuários em todo o mundo exige uma infraestrutura robusta e com alto consumo de energia. Portanto, qualquer análise séria sobre o impacto ambiental da tecnologia e as metas de sustentabilidade das empresas de tecnologia precisa olhar de perto para o consumo e a eficiência energética dos seus data centers.
A Luta pela Neutralidade de Carbono
O conceito de neutralidade de carbono, também conhecido como carbono neutro ou net zero, ganhou destaque na agenda global e corporativa. Essencialmente, alcançar a neutralidade de carbono significa que as emissões de gases de efeito estufa liberadas na atmosfera são compensadas por ações que removem ou reduzem uma quantidade equivalente desses gases. O dióxido de carbono (CO₂) é um dos principais gases de efeito estufa e um dos focos centrais das estratégias de neutralização. O objetivo primordial dessa iniciativa é minimizar o impacto ambiental da tecnologia e das atividades humanas em geral, buscando um equilíbrio entre as emissões e a capacidade de absorção de carbono pelo meio ambiente.
Para as empresas, especialmente as de grande porte e com operações globais como as big techs, a busca pela neutralidade de carbono envolve uma combinação de estratégias. A mais importante delas é a redução das emissões na fonte. Isso pode incluir a otimização do uso de energia em suas operações, a transição para fontes de energia renovável, a melhoria da eficiência de seus equipamentos e processos, entre outras medidas. Além da redução, a compensação das emissões restantes é outra estratégia comum. A compensação pode ser feita através de investimentos em projetos de reflorestamento, captura de carbono, ou até mesmo pela compra de créditos de carbono, que representam a redução ou remoção verificada de uma tonelada métrica de CO₂ equivalente da atmosfera. Muitas empresas de tecnologia têm anunciado metas ambiciosas para alcançar a neutralidade de carbono, algumas visando datas tão próximas quanto 2030. No entanto, a execução dessas metas no contexto do rápido avanço da inteligência artificial tem se mostrado um desafio complexo.
Metas Climáticas sob Escrutínio: O Estudo Revela Discrepâncias
É neste ponto que entra o relatório conjunto do NewClimate Institute e da Carbon Market Watch, que coloca as metas climáticas das grandes empresas de tecnologia sob um olhar crítico. O estudo avaliou a credibilidade das promessas de neutralidade de carbono anunciadas por gigantes como Apple, Google, Microsoft, Meta e Amazon. A conclusão é clara e preocupante: as metas que preveem alcançar a neutralidade entre 2030 e 2040 carecem de credibilidade real diante do aumento implacável no consumo energético, amplamente impulsionado por sistemas de inteligência artificial como o ChatGPT e outros modelos de linguagem.
Especialistas ouvidos no relatório apontam que os compromissos climáticos dessas empresas, em muitos casos, utilizam metodologias que já se mostram ultrapassadas. Elas não parecem refletir adequadamente o aumento exponencial no consumo energético causado pelo avanço e pela disseminação das tecnologias de inteligência artificial. A principal fonte de emissões de CO₂ no setor, a eletricidade consumida pelos data centers, viu sua demanda disparar com o crescimento da IA. Apesar de todas as cinco empresas avaliadas terem algum nível de compromisso com a energia renovável, apenas a Apple se comprometeu a usar 100% de energia renovável em toda a sua cadeia de produção até 2030. As demais, segundo o estudo, ainda não possuem metas claras e abrangentes nesse sentido.
O Real Impacto Ambiental da Tecnologia e as Emissões das Big Techs
O impacto ambiental da tecnologia, especialmente no que diz respeito às emissões de CO₂, vai muito além do consumo direto de energia nos data centers. O relatório do NewClimate Institute e Carbon Market Watch jogou luz sobre essa questão, revelando que a maioria das grandes empresas de tecnologia não está contabilizando de forma completa e transparente a sua pegada de carbono. De acordo com o levantamento, empresas como Microsoft, Meta e Amazon receberam a classificação “medíocre” em relação à integridade de suas estratégias climáticas. Apple e Google tiveram uma avaliação um pouco melhor, classificada como “moderada”. A principal razão para essa classificação relativamente baixa é a enorme diferença entre os objetivos declarados publicamente e o aumento real das emissões de carbono.
O caso do Google é particularmente ilustrativo. Apesar de seus investimentos em energia renovável e seus compromissos ambientais, as emissões de CO₂ da empresa quase dobraram entre 2019 e 2023. Este aumento coincide com um período de intenso desenvolvimento e expansão das capacidades de inteligência artificial da empresa. Isso sugere que os esforços atuais para mitigar as emissões não estão conseguindo acompanhar o ritmo do crescimento impulsionado pela IA e pela demanda por seus serviços. Google, Apple e Meta se comprometeram a alcançar a neutralidade de carbono em 2030. A Amazon, por sua vez, estabeleceu 2040 como seu marco para neutralidade, enquanto a Microsoft tem uma meta ainda mais ambiciosa de ter um saldo de carbono negativo em cinco anos. No entanto, sem uma mudança significativa na forma como contabilizam e reduzem suas emissões, essas metas parecem cada vez mais desafiadoras.
Além da Energia Limpa: Cadeia de Produção e Fornecedores Terceirizados
Um dos pontos críticos destacados pelo relatório é que o investimento em energia limpa, embora crucial, não é suficiente por si só para compensar a crescente demanda elétrica impulsionada pela expansão da inteligência artificial. Chatbots, modelos de linguagem e outras aplicações de IA exigem uma quantidade significativa de energia para operar, e essa energia é consumida em grandes centros de dados. Mesmo que uma empresa utilize energia renovável para abastecer seus próprios data centers, isso não aborda completamente o problema se a demanda total por energia continuar a crescer em um ritmo insustentável.
Além disso, o estudo aponta para lacunas significativas na forma como as empresas contabilizam suas emissões de CO₂. Muitas delas não incluem em seus relatórios a pegada de carbono gerada por fornecedores terceirizados de infraestrutura. Isso é um problema considerável, pois esses fornecedores são responsáveis por cerca de metade da capacidade de processamento em nuvem utilizada pelas big techs. Se as emissões desses parceiros não são contabilizadas, a imagem real do impacto ambiental da tecnologia e das emissões totais da empresa fica distorcida. Outro ponto crucial que frequentemente é subestimado é a cadeia produtiva dos dispositivos eletrônicos que vendem. A fabricação de smartphones, laptops e outros gadgets consome uma grande quantidade de energia e recursos, gerando emissões de CO₂ significativas. O relatório estima que a cadeia produtiva desses dispositivos representa mais de um terço das emissões totais do setor de tecnologia. Ignorar ou subestimar essas fontes de emissão torna as metas de neutralidade de carbono menos críveis e mais difíceis de alcançar na prática.
Impacto e Implicações
As descobertas deste relatório têm implicações profundas para as grandes empresas de tecnologia, para o futuro da inteligência artificial e para o planeta. Para as big techs, o estudo serve como um alerta de que suas estratégias de sustentabilidade precisam ser urgentemente revisadas e ampliadas para abarcar a realidade do consumo energético impulsionado pela IA e considerar todas as fontes de emissão em suas cadeias de valor. A reputação dessas empresas, que frequentemente se posicionam como líderes em inovação e responsabilidade social, pode ser seriamente afetada se a distância entre suas promessas e suas emissões reais continuar a aumentar. Para o desenvolvimento futuro da inteligência artificial, o relatório destaca a necessidade de buscar soluções mais eficientes em termos de energia. A pesquisa em IA precisa incorporar considerações sobre o consumo de recursos desde as fases iniciais de design e treinamento de modelos. Afinal, uma inteligência artificial poderosa, mas com um custo ambiental proibitivo, não é uma solução sustentável a longo prazo. Para a sociedade e o planeta, o aumento das emissões de carbono, mesmo no setor de tecnologia, contribui para as mudanças climáticas, com todas as suas consequências devastadoras. Este cenário reforça a urgência de uma transição global para fontes de energia mais limpas e para a adoção de práticas de consumo mais conscientes em todos os setores.
Conclusão
O relatório sobre as metas climáticas das big techs e o impacto ambiental da tecnologia nos força a refletir sobre o paradoxo do progresso tecnológico. A inteligência artificial, com seu potencial transformador, vem acompanhada de um custo ambiental que não pode mais ser ignorado. As ambições de neutralidade de carbono das gigantes da tecnologia são louváveis em teoria, mas sua execução parece estar tropeçando na realidade do aumento do consumo de energia e na falta de uma abordagem holística que inclua todas as fontes de emissão. É fundamental que essas empresas revisitem suas estratégias, invistam massivamente em eficiência energética, expandam o uso de energia renovável para toda a sua cadeia de valor e, crucialmente, contabilizem de forma transparente o impacto ambiental da tecnologia que utilizam e produzem, incluindo fornecedores e a cadeia de produção de dispositivos. O futuro do nosso planeta e a sustentabilidade do próprio avanço tecnológico dependem de uma ação decisiva e realista agora.
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Pontos Principais
- Metas de neutralidade de carbono de big techs são questionadas devido ao alto consumo energético da inteligência artificial.
- Data centers são grandes consumidores de energia e principais fontes de emissões de CO₂ no setor tech.
- Estudo aponta que metodologias usadas pelas empresas estão desatualizadas e não refletem o crescimento da demanda de energia pela IA.
- Empresas como Microsoft, Meta e Amazon receberam classificação “medíocre” em integridade de estratégias climáticas; Apple e Google, “moderada”.
- Emissões de CO₂ do Google quase dobraram entre 2019 e 2023, apesar de investimentos em energia renovável.
- Investimento em energia limpa não compensa o rápido aumento da demanda energética da IA.
- Muitas empresas não contabilizam emissões de fornecedores terceirizados e da cadeia produtiva de dispositivos, que representam parcelas significativas do impacto ambiental da tecnologia.
- Ações mais rigorosas e transparentes são necessárias para que as big techs alcancem a neutralidade de carbono.
A referência original que inspirou este notícia pode ser encontrada em https://olhardigital.com.br/2025/06/28/pro/meta-de-big-techs-de-zerar-carbono-esta-descolada-da-realidade-aponta-estudo/, e foi produzida com o apoio de inteligência artificial.